Pensamentos de Clarice Lispector
Parece que às vezes sou espontânea demais e isso me torna engraçada.
Não me posso resumir porque não se pode somar uma cadeira e duas maçãs. Eu sou uma cadeira e duas maçãs. E não me somo.
Eu não sou uma sonhadora. Só devaneio para alcançar a realidade.
Mas eu sou uma chata que parece viver com medo de dizer as coisas claramente.
Escrevo muito simples e muito nu. Por isso fere. Sou uma paisagem cinzenta e azul. Elevo-me na fonte seca e na luz fria.
Eu acho que, quando não escrevo, estou morta.
Desejo que você não esmoreça, porque é tão bom estar de “bom jeito”. Acho que eu devia abandonar minha “tragédia” em um ato...
A esperança também não tem número. Perder uma coisa é inefável: nunca sei onde as coloquei. (...) Ser é de um provisório impalpável. (...) Juro que preciso de soluções. Não posso ficar assim completamente no ar.
Estou tentando te dizer de como cheguei ao neutro e ao inexpressivo de mim. Não sei se estou entendendo o que falo, estou sentindo – e receio muito o sentir, pois sentir é apenas um dos estilos de ser.
O que não sei dizer é mais importante do que o que eu digo.
Que faço dessa lucidez? Sei também que esta minha lucidez pode-se tornar o inferno humano – já me aconteceu antes.
Nota: Trecho da crônica A lucidez perigosa.
...MaisO ponto de partida deve ser: “Não sei.” O que é uma entrega total.
Estou cansada de pessoas e sozinha me aborreço. Eu mesma não sei o que quero.
É porque sempre tento chegar pelo meu modo. É porque ainda não sei ceder. É porque no fundo eu quero amar o que eu amaria – e não o que é.
Não sei o que fazer da aterradora liberdade que pode me destruir. Mas enquanto eu estava presa, estava contente? ou havia, e havia, aquela coisa sonsa e inquieta em minha feliz rotina de prisioneira?
O pouco que sei não dá para compreender a vida, então a explicação está no que desconheço e que tenho a esperança de poder vir a conhecer um pouco mais.
Só que não sei usar amor: às vezes parecem farpas.
Eu sei de muito pouco. Mas tenho a meu favor tudo o que não sei e – por ser um campo virgem – está livre de preconceitos. Tudo o que não sei é a minha parte maior e melhor: é minha largueza. É com ela que eu compreenderia tudo. Tudo o que eu não sei é que constitui a minha verdade.
Fico tão assustada quando percebo que durante horas perdi minha formação humana. Não sei se terei uma outra para substituir a perdida.
Sei que as coisas são complicadas. Mas são ao mesmo tempo simples. Elas se complicam à medida em que se tem medo da simplicidade – porque essa simplicidade seja o fato em si, a verdade.