Coleção pessoal de Nanevs

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Meu eu é enigma
Não sabe de si
E não entende quem lê
O que escrevi
Paradigmas de mim
Perdido nas entrelinhas
Das minhas poesias

Paradigmas

Escrevo meu eu
Em linhas tortas
Que bem diferentes
Das do Criador
Não chegam retas
Ao seu final

Meu eu é enigma
Não sabe de si
E não entende quem lê
O que escrevi
Paradigmas de mim
Perdido nas entrelinhas
Das minhas poesias

Espero que o outro
Poeta maior
Faça das linhas tortas
Do meu enredo
Entrelinhas melhores
Que as minhas
E escreva certo
O meu eu poesia

Recolho meus sonhos
Refaço meus planos
Espero pelo tempo
De tornar a sonhar

Tempo de acordar
De novo meu sonho
Esbarra na realidade
O vil metal
Destroça tudo
Não posso nada
Sonhar é lírico
Despertar é duro...
No concreto da vida
A argamassa temperada
Calcifica tudo
Endurecendo a alma
Que em vão tenta sorrir
Mas está condenada
À sobreviver
Concretamente...
Desistir jamais
Bato em retirada
Não é hora de sonhar
O relógio me avisa
É hora de acordar...
Recolho meus sonhos
Refaço meus planos
Espero pelo tempo
De tornar a sonhar

A terra
Que por ora me serve
Se servirá de mim
E serei adubo
Se não de flores
Dos vermes que me aguardam
Pacientes e certeiros
Do banquete à ser servido

Adormecidas

Adormeci
Todos os meus quereres
A anestesia entorpeceu
Todos os meus desejos
E à Cesar o que é de Cesar
Foi dado com louvor
Nada peço e nada quero
Além do meu recolhimento
Na terra
Busco bem mais do que plantei
Sujo(?) minhas mãos já calejadas
Mergulhando-as no estrume
Que ironicamente
Dará vida ao alimento do meu corpo
E da minha alma
Poesia não enche barriga
E a minha há muito não rima com nada
É pobre tanto quanto sua autora
E numa mesma cama
Adormeceram
A terra
Que por ora me serve
Se servirá de mim
E serei adubo
Se não de flores
Dos vermes que me aguardam
Pacientes e certeiros
Do banquete à ser servido
Adormeci somente
Enquanto sobre a terra, ando
Que me seja leve quando sob ela
Me deitar de vez

Chamo e clamo
Todos os dias
Por ela
Que se faz de rogada
E adia sua chegada
Mas sei que virá
Para me buscar
Não vai demorar

Ela

Ela virá
E me abraçará
Com seus braços longos
Num abraço final
Estou esperando
Sei que virá
E irei sorrindo
Para onde ela me levar
Chamo e clamo
Todos os dias
Por ela
Que se faz de rogada
E adia sua chegada
Mas sei que virá
Para me buscar
Não vai demorar
Já ouço seus sinais
Já sinto seu cheiro
Ela virá
E me levará

De bandeja

Rasgo minhas veias
Em palavras natimortas
Sujas do sangue
Esvaído do coração
Abruptamente parado
Seco
Mero músculo sem vida
Servido na bandeja
Da morte
Parou no sinal vermelho
Não pulsa mais
De nada serve
Talvez ainda seja possível
Servir de alimento
Aos cães vadios
Que rondam esfomeados
A bandeja vermelha
Com o coração parado
Servido

Vinde à mim a noite
Traga-me a morte
Me envolva em seu manto

....pediu a Santa que
a aliviasse. Fez novena, rezou o terço, se ajoelhou, implorou, chorou. Mas a Santa não
a ouvia...parecia surda, ou quem sabe ouvia apenas quem sabe rezar (não era o seu caso).

A espera
Era para ser apenas uma brincadeira, mas o destino, como quem quer brincar também,
resolveu interferir e revirou tudo sem se preocupar com as consequências.
Uma teia, um amaranhado...e ela lá, cada vez mais se embrenhando, sem sentir
o perigo rondando.
Não teve nunca a intenção de machucar, ou mesmo de iludir. Só queria mesmo se divertir.
O mal estava feito, mas ela não percebeu. Embora como que por intuição, se aproximou
mais e mais do precipício. Deixou-se envolver e ladeira abaixo mergulhou, crente estar segura...
Nada mais importava, só o fato de alcançar o objetivo da sua loucura. A meta desejada e
insanamente buscada. Não percebia que o lume era lodo e que cada vez mais a arrastava
às profundezas sem deixar possibilidade de voltar. E ela mergulhava cada vez mais fundo...
A teia ser formou, asfixiou. O ar já rarefeito, faltando cada vez mais...pediu a Santa que
a aliviasse. Fez novena, rezou o terço, se ajoelhou, implorou, chorou. Mas a Santa não
a ouvia...parecia surda, ou quem sabe ouvia apenas quem sabe rezar (não era o seu caso).
A noite, que antes se fazia clara e com luar, agora se faz negra e fria. O ar, que faz falta aos
pulmões, também negros e doloridos, é fétido e escasso.
Ela clama pela morte. Chama-a a todo instante, não suporta as dores. As teias a prende
com tanta força...enforcam, faz doer e doer e doer...se ao menos pudesse dar fim a tudo...
Uma bala na cabeça, um veneno fulminante, um suicídio honroso...ainda não. O tempo
não para, e a mãe espera dela, mesmo sabendo que já não pode dar o que precisa.
O poço é profundo. A luz não existe, só a escuridão...as vozes que ouve são de seres
nefastos induzindo-a à morte. Ela vai indo...mais e mais...se afundando na lama fétida.
Não precisa mais de mão alguma. Sabe se matar sozinha...mas ainda não pode ser
agora. Alguém, que também se vai (para o céu), tenta desesperadamente ficar, na mera
e vã esperança de acender a luz nos olhos dela. Tenta em vão mostrar que o túnel pode
acabar e o sol surgir.E nessas mãos entrelaçadas, da morte boa com a morte má, o destino
vai brincando enquanto elas não chegam.
A mãe, fragilizada e caquética, carrega com galhardia o peso nos ombros da filha mergulhada
nas teias que teceu e que agora não sabe se desvencilhar. Esperam pela morte que teima em não
chegar. Esperam unidas pelo fim amargo que hão de as separar num outro plano.

Mistura de almas

Passo por mim sem reconhecer
O ser que sou, ou penso ser
Me fito atônita
Sou eu ou é você
Esse ser...
Me confundo no você
Que mora em mim
Sabendo que sou eu
Esse estranho você...
Agora vem
Essa alma pendida
Gritar fora do corpo
Que uma outra alma
Toma-lhe o espaço...
Embaralha o pensamento
Mistura de almas
O "eu" e o "você"
Vai saber
Quem é quem...
Em meio à aflição
Vivem almas conflitantes
Dispersas de objetivos
Em nada comuns...
Busco em vão
Saber de mim
Se sou eu ou se você
De fato quem sou

Virás resoluta
Sabendo me encontrar
E para onde levar
Toda a poesia calada
Que de mim não saiu
As palavras guardadas

Poesia calada

Virás me abraçar
Inevitavelmente, virás

Talvez seja na noite
Ou mesmo no dia
Mas ainda que sem aviso
Chegarás
E me tomarás em teus braços
Num aconchego fatal
Sem lástimas ou soluços
Deixando fluir apenas
Uma lágrima sorriso
Do partir silencioso

Virás resoluta
Sabendo me encontrar
E para onde levar
Toda a poesia calada
Que de mim não saiu
As palavras guardadas

As tantas que fiz
Ressoarão no ar
E se perpetuarão
Nos olhos que as lerem
Quando mais não me virem
No abraço que virá

Serei então eu
A poesia calada
Por vezes declamada
Certa da hora chegada
De noite ou de dia

Sofro
Não por ti
Mas por mim
Que insisto em querer
O que nunca hei de ter

The end

Sofro
Não por ti
Mas por mim
Que insisto em querer
O que nunca hei de ter

Sinto
Não por mim
Mas por ti
Que vai sofrer
Sem nada eu poder fazer

Choro
Por nós
Que não vivemos
O que tivemos
E deixamos ir
Por covardia

Lamento
O seu silêncio
Contido
Nem tão sentido
Talvez divertido
De quem brincou
De amar
Sem nunca se dar

Findo
O que me mata
Antes que morra
E nada mais
Eu tenha a rabiscar

Plantada

Que tanto tempo é esse
Que os dias tão lentamente passam
E o tédio parece morar em mim

E falta a paciência
E sobra a ansiedade
Por não ver passar o tempo
E germinar somente

Tal qual semente plantada
Espero o desabrochar
Entre as ervas daninhas
Que talvez seja (uma) eu mesma

Vem a chuva
Vem o sol
O frio
O calor
Passam dias
Meses
Anos
E eu ali
Esperando
O tempo
Incólume

Onde estão os frutos
Os amores
Os amigos
As danças
As ruas
A vida

O espelho na parede
O reflexo impávido
Um assombro sem reflexão
Uma certeza
O fato
Percepção tardia

Esse tempo que não passa
Voa
E não volta mais

Onde estão os frutos
Os amores
Os amigos
As danças
As ruas
A vida

E virá um tempo
Em que te olharei nos olhos
E só flores verei
Então terá passado a dor
E serei tão somente amor