Leonardo R. Pessoa

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⁠Não espere a primavera chegar
inspire-se nos ipês e floresça
A_Gosto.

Inserida por Epifaniasurbanas

⁠A criança antevê a felicidade, não espera que ela chegue para ser feliz.

Inserida por Epifaniasurbanas

⁠A sacralidade nas refeições.

Há certa equidade no rito das refeições. Sob a toalha, já não se vê quem é maior. A mesa esconde nossas deficiências.

Sentados, a única urgência é pela comunhão, que é repartida juntamente com o pão e a manteiga. O sagrado tem sabor de café.

Quando nestes encontros falamos, rimos e recordamos, as horas voam diante da saudade acumulada, e notamos que, pelo menos por alguns instantes, conseguimos arranhar a eternidade.

Algum aparelho sempre toca e, espantados com o horário, sabemos que é o momento de partir.

Na porta, ao nos despedirmos, alguém intencionalmente sacode a toalha do café, assim as aves também poderão se alimentar com as migalhas dos nossos momentos.

Inserida por Epifaniasurbanas

⁠Quando abraço alguém, fecho os olhos e demoro pelo menos uns trinta segundos antes de soltar. Neste tempo, consigo ouvir exatamente cada pulsar do coração. Acredito que cada coração tem um ritmo, como se fosse um timbre vocal. Convido-te a ouvir! Para isso, é preciso que eu saia da superficialidade dos sentidos. No último abraço que dei, pude escutar as palavras mudas de um coração: "Obrigado por estar aqui."

Inserida por Epifaniasurbanas

⁠Viver por vezes parece ser apenas adiantar o trabalho do dia seguinte. No domingo, já estamos pensando na segunda-feira, na terça-feira, já estamos de olho na quarta-feira, e assim por diante, sempre um passo à frente do dia presente. Com tanta antecipação, acabaremos vivendo um mês a menos.

Nossa mente, assim como a vida, é uma tecelã desatenta que não distingue entre fios de ouro e fios de sombra. Ela não seleciona memórias como boas ou más; simplesmente as deixa dançar ao sabor do vento da lembrança. Daí o perigo de se viver de amanhã.

O tempo, esse trapaceiro imprevisível, teima em desafiar nossas noções de permanência, sempre nos lembrando de sua natureza efêmera. No entanto, no meio desse emaranhado de efemeridades, o amor emerge como um oásis de eternidade. É nele que residem todas as histórias que o tempo já arrastou consigo, como conchas preciosas depositadas na praia do coração.

Sempre que puder desperdice simpatia, pois é o amor que empregamos no cotidiano dos nossos dias que nos fará celebrar não apenas o tempo que já vivemos, mas também o tempo que ainda teremos para tecer novas memórias e se encantar com suas infinitas possibilidades.

Inserida por Epifaniasurbanas

⁠⁠Um passarinho na janela

Era uma manhã como tantas outras, quando minha atenção foi capturada por um pequeno pássaro que, com graça e leveza, pousou na janela de minha casa. O passarinho, em sua serena vivacidade, parecia trazer consigo um mundo de reflexões.

Suas asas delicadas tocavam o vidro com a leveza de quem afaga o próprio destino, e seus olhos, dois pontos brilhantes, refletiam a quietude de um espírito livre, como quem tem um céu inteiro dentro de si. A presença daquele pássaro revelou-se como um oráculo silencioso, sugerindo-me que a vida, em sua essência, é uma eterna contemplação do invisível.

Enquanto o passarinho perscrutava o horizonte, pensei nas vezes em que nós, humanos, presos em nossas angústias, deixamos de perceber as belezas simples que nos cercam. Ignorância é acharmos que pássaros, só porque têm asas, não caem ou que nunca descansam nos tapetes de Deus durante o seu percurso. Essa liberdade não tem nada a ver com invencibilidade.

O pássaro, em sua graciosa indiferença, ensinava-me a arte da quietude, a contemplação do instante presente, a sabedoria de viver sem pressa.

E assim, naquele encontro fortuito, compreendi que a janela não era apenas uma barreira física, mas uma metáfora da alma, uma passagem para a introspecção e para o entendimento do nosso lugar no mundo. O passarinho, ao pousar na janela, não apenas a tocava, mas convidava-me a abrir as portas do meu próprio coração para as sutilezas da vida.

Inserida por Epifaniasurbanas

⁠Esperança é um menino de pés descalços brincando entre nós. Não se contenta em esperar, mas age com a simplicidade dos pequenos gestos. Vive o presente como quem descobre um inseto no quintal, agradecendo ao passado sem se deixar aprisionar por ele. O passado é um rio. A vida segue. O futuro deve ser olhado com a calma de quem observa nuvens. Algumas coisas mudam com nossas mãos; outras, como o tempo, nos cabe aceitar. Isso é esperança.

Inserida por Epifaniasurbanas

⁠À margem, aguardo o repouso do rio.
Ao ouvir o murmúrio de suas águas, aquieto-me.
Sinto um amalgama de esperanças futuras
e temores imediatos.
Transbordo.
Rompo diques, mas nunca é o suficiente.
Estou exausto!
Reprimo-me.
Sustento um pequeno universo.
Será que algum dia alcançarei minha margem?
E, ao lá chegar, poderei finalmente descansar?
E, nesse merecido repouso, encontrarei
ouvidos ávidos por meus murmúrios, com o intuito de descobrir neles a sua própria serenidade?
À margem, aguardo o repouso do rio...

Inserida por Epifaniasurbanas

Amor à primeira vista, mistério súbito,
Que surge sem aviso, como um sopro,
E, de repente, tudo é novo e mágico,
Mas, ah!, quando só um sente, há um hiato.

No encontro breve, o coração se abre,
Um fio invisível que não se explica,
Mas às vezes só um ama, e o silêncio invade,
Do outro é um vazio que tudo avisa.

Ó amor, que nasce num único olhar,
E nos deixa, às vezes, perdidos no ar,
Na doce e dolorosa ilusão de um solitário desejo.

Entre águas e encantos

O Boto

Deslizando
Entre águas e encantos
Sigo navegando pelo Solimões
Não estou bicho nem homem
Estou
À tua espera

Num tempo
Suspenso na correnteza
Remos parados no momento
De tua ausência

Não preciso de rede
A me prender
Tua falta é corrente mais eficaz
A me segurar

Sou soma de encantos
Amontoado de lendas
Esperanças e sombras

Tudo o que me resta
Pesado numa balança
De um só prato

Seguindo
O curso de um rio de histórias
Não desisto
De te buscar entre as águas
Teu amor
É o que me leva a existir

A Virgem

Meus passos ecoam as margens do Rio Negro
Minha voz já é parte da floresta
Meu coração habita entre vitórias-régias

Busca-me
Perco-me em ti
Para me tornar inteira
O espetáculo
Na junção de nossas águas
Lenda viva
Amazonas

Existiremos
Como o encanto perfeito
Horizontal
Assim como o rio que rasga a floresta

Nossa fertilidade
Garantida
Na umidade dos dias
Ecos de canções
Rios, igarapés e os guardiões da flora serão testemunhas
Os peixes e as feras verão
Nosso mistério
Existo, existiremos
Apressa-te,
Leva-me
Para dentro da lenda

Inserida por Epifaniasurbanas

Estrela

Ah,
como são belos esses fragmentos de luz própria
que insistem em brilhar mesmo já findos há muito.

Estrela,
enganas o tempo,
este que a tudo destrói menos teu brilho.

Tu,
luzeiro meu,
tal qual tapete celeste,
és aquilo que termina, mas em mim nunca acaba.

Inserida por Epifaniasurbanas

⁠Fotossíntese

Assim que a vida floresce, dissipa-se a névoa,
Sentimento de raiz, movimento de folha.
Aprofunda-se na terra, água e sais. Embriaga-se e se perde em si.

No tocar dos raios, folha e fruto,
A luz que amadurece o verde,
Alimenta a distância. Clorofila.
As folhas umedecem as margens.
Deixe-as,
Em silêncio, crescendo.

A luz não carrega limites. Transcende e vira sentido. Sacralidade.
Para a savana de herbívoros pastando,
Alimento. Para um rio sem correnteza, Continuidade.

Serve de abrigo nas copas,
Sombra em seus meios.
Em feixes e cores, no desabrigo de Imagens encontra-se o manto verde.

Inserida por Epifaniasurbanas