O gringo no Café Central. Assim meu pai... Nerisírley Barreira do...

O gringo no Café Central.

Assim meu pai me contou, enquanto ria; a história de um gringo no Café Central.

Era lá pelas bandas do final dos anos cinquenta, um gringo muito chique, metido à besta, resolveu vir à Goiânia para ganhar dinheiro. Mas como todo inglês que se preze, fez um curso de Português com um erudito de Portugal. E como todo homem prevenido, trouxe o professor com ele até o Rio de Janeiro.


Três meses de viagem, o tal inglês hospedou-se no Grande Hotel.
E hotel você já sabe... pagando bem... eles entendem até língua de cachorro! Lá eles ensinaram que um homem de “porte” como ele, deveria ir ao Café Central para fazer contatos.


O homem se ajeitou. Colocou seu terno escuro, completinho. Até com colete e gravata com broche. Chapéu preto e sapato escuro. Tudo na risca de giz, fresquinho; para Londres. Saiu o cândido, rumo ao Café Central, a pé. Sentindo-se!


Eram três da tarde, onde passava, os homens de chapéu branco olhavam para ele e o cumprimentavam. Logo, o gringo percebeu que talvez teria que ouvir com mais cuidado os cumprimentos porque os fonemas saiam todos iguais numa palavra só:


_Bastard! Boatard!


Quanto mais as pessoas o cumprimentavam, mais calor ele sentia. Era o meio de setembro.


E... depois de encharcado de suor. O homem chega no aglomerado de pessoas, na esquina da Avenida Anhanguera com a Rua 7, que era o Café Central.


Adentrando o gringo; meu pai, mocinho do Lyceu, que estava de fora do estabelecimento; olhou de soslaio aquele branco de dar dó. Preto riscado, empoeirado, com uma mistura de perfume e um “certo cheirinho”.


Lá dentro, ninguém olhou para o homem. Todos absortos na sua própria conversa, em negociações. Um burburinho entre comerciantes de tudo. Conforme o recomendado pelo funcionário do Grande Hotel, o inglês foi de pronto ao balcão.


Avistou um atendente, que abriu um sorriso quando olhou outro homem que chegou de terno de linho branco e botas de cano alto. Sem cerimônia, o intruso sentou-se no banco que, para o inglês era dele. Depois do susto, resignado diante de sua ansiedade, o protagonista acomodou-se ao lado do homem e pôs-se a observar.


_ Bastardeee Tiaozim! Que vaicê ogi?
_ Bastardiii! Demaisdaconta! Dissempri!
_Intão-tá!


O atendente virou-se todo feliz para trás e pegou um cestinha com pão-de-queijo e uma xícara de café. Voltou-se ao moço.


Nisso, o inglês vendo a cena, já começava a sentir um certo frio na barriga. Pois não compreendia nada do que eles falavam. Fitava-os atentamente. Agora, nosso fidalgo, sentia-se um mero protagonista.


O moço trouxe o café, colocou para o jovem ao lado e com um bule de leite numa mão, perguntou:


_ Poçopô?
_ Pó-pô!


Ele colocou um pouco. O rapaz deu um gole e o atendente olhou para o inglês. Tudo pareceu em câmera lenta. Nisso, o homem já não suava de calor, mas frio de nervoso. Olhou atentamente para a boca do atendente tentado decifrar o que ele falava: _ Êita língua difícil! Ainda tem que mudar?


O atendente meio que receoso que talvez o homem muito que arrumado estivesse a passar mal. Fitou-o esperando uma resposta, quando o nosso insigne ia responder...suspirou aliviado! O garçom voltou-se para o moço de branco.


_ Tiaozim pó-pô mais?
_ Mais é clar-que-sim!
Colocou mais café na xícara e voltou com o “indigesto dialeto”:
_ Quémais?
_ Pó-pô!
Colocou mais.
_ Pó-pô-mais?
_ Pó-pô-mais!
_ Tá bãmassim?
_Num tá-não! Pó-pô-mais!


Nosso excelso ficou mais apreensivo. Compreendeu que o homem nativo, negou, afirmou para negar. E como se não bastasse, terminou afirmando novamente em imperativo! E o atendente nem achou ruim. Parece que agora ele sentia sua gravata muito apertada e sua boca extremamente seca.


De repente, o atendente olha para ele e faz uma pergunta. Assustado o ingles respondeu:


_I would like to a cup of tea and a glass of water, please. _ traduzindo: “Eu gostaria de tomar uma xícara de chá e um copo de água, por favor.” _ Of course! One moment please. _ traduzindo: Claro! Um momentim, por favor!


E não era que o garçom falava o Inglês!


O problema é que o inglês não sabia nada de Goianês. Êita sô! Tem base um troço desses?


Nerisírley Barreira do Nascimento 2018.