Coleção pessoal de mandinhang

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As grandes obras deste mundo foram sempre realizadas por doidos.

Agradeço ao destino por ter-me feito nascer pobre. A pobreza foi-me uma amiga benfazeja; ensinou-me o preço verdadeiro dos bens úteis à vida, que sem ela não teria conhecido. Evitando-me o peso do luxo, devotou-me à arte e à beleza.

Na noite onde todos estamos, o sábio esbarra com a parede, enquanto o ignorante fica tranquilamente no meio do quarto.

Considero o conhecimento de si mesmo como uma fonte de preocupações, de inquietações e de tormentos. Tenho-me frequentado o menos possível.

Não que a vida seja maravilhosa, mas há um poeta nascendo, um menino tocando violão, uma criança brincando,um louco dançando e eu a sorrir !

Algum tempo atrás, talvez uns dias, eu era uma moça caminhando por um mundo de cores, com formas claras e tangíveis. Tudo era misterioso e havia algo oculto; adivinhar-lhe a natureza era um jogo para mim. Se você soubesse como é terrível obter o conhecimento de repente - como um relâmpago iluminado a Terra! Agora, vivo num planeta dolorido, transparente como gelo. É como se houvesse aprendido tudo de uma vez, numa questão de segundos. Minhas amigas e colegas tornaram-se mulheres lentamente. Eu envelheci em instantes e agora tudo está embotado e plano. Sei que não há nada escondido; se houvesse, eu veria.

Sou como o rascunho de um livro que foi escrito a mão, sem metodologia e referencial teorico... Na borda estão os desenhos... Os erros não estão ocultos mas foram riscados[...]

Tenho tanto sentimento

Tenho tanto sentimento
Que é frequente persuadir-me
De que sou sentimental,
Mas reconheço, ao medir-me,
Que tudo isso é pensamento,
Que não senti afinal.

Temos, todos que vivemos,
Uma vida que é vivida
E outra vida que é pensada,
E a única vida que temos
É essa que é dividida
Entre a verdadeira e a errada.

Qual porém é a verdadeira
E qual errada, ninguém
Nos saberá explicar;
E vivemos de maneira
Que a vida que a gente tem
É a que tem que pensar.

E quase que eu me sento no mesmo lugar, mas certo repúdio me impediu, jogando-me para fora, evitando a mesma cena. Era costume eu me sentar em degraus para esperar e, hoje não espero, não acostumo e não me sento em degraus...

Salvar é digno, salvar-se é luxo

Quando criei pela primeira vez eu era criança e o mundo estava torto, como um ponto de interrogação... Quando criei pela segunda vez, terceira vez... Na adolescência o mundo era quadrado e por revolta fiquei um tempo sem criar... Hoje estou a escrever pois acho terapêutico, escrevo sempre quando me esqueço de sentir o vento no rosto!

Vida... Me fale sobre a psicologia... Para que eu possa duvidar de alguns livros!

“É tanto passado no presente, a criança na mente, os gestos da gente... O inconsciente... Cuidar da arvore para colher as sementes... ”

Saiba que o deserto é claro, amplo e só... É preciso um pouco de chuva para matar a sede... É preciso esconder o sol e acender a luz!

Preciso de alguém que dance comigo essa noite e me abrace quando eu errar o passo... Preciso de alguém para eternizar o sabado... Alguém que, como eu, deteste o domingo

O fogo que me faz arder é o mesmo que me ilumina

O senhor… mire veja: o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas – mas que elas vão sempre mudando. Afinam ou desafinam. Verdade maior. É o que a vida me ensinou. Isso que me alegra, montão.

As coisas assim a gente não perde nem abarca. Cabem é no brilho da noite. Aragem do sagrado. Absolutas estrelas.

As coisas mudam no devagar depressa dos tempos.

— O meu nome é Severino,
como não tenho outro de pia.
Como há muitos Severinos,
que é santo de romaria,
deram então de me chamar
Severino de Maria
como há muitos Severinos
com mães chamadas Maria,
fiquei sendo o da Maria
do finado Zacarias.

Mais isso ainda diz pouco:
há muitos na freguesia,
por causa de um coronel
que se chamou Zacarias
e que foi o mais antigo
senhor desta sesmaria.

Como então dizer quem falo
ora a Vossas Senhorias?
Vejamos: é o Severino
da Maria do Zacarias,
lá da serra da Costela,
limites da Paraíba.

Mas isso ainda diz pouco:
se ao menos mais cinco havia
com nome de Severino
filhos de tantas Marias
mulheres de outros tantos,
já finados, Zacarias,
vivendo na mesma serra
magra e ossuda em que eu vivia.

Somos muitos Severinos
iguais em tudo na vida:
na mesma cabeça grande
que a custo é que se equilibra,
no mesmo ventre crescido
sobre as mesmas pernas finas
e iguais também porque o sangue,
que usamos tem pouca tinta.

E se somos Severinos
iguais em tudo na vida,
morremos de morte igual,
mesma morte severina:
que é a morte de que se morre
de velhice antes dos trinta,
de emboscada antes dos vinte
de fome um pouco por dia
(de fraqueza e de doença
é que a morte severina
ataca em qualquer idade,
e até gente não nascida).

Somos muitos Severinos
iguais em tudo e na sina:
a de abrandar estas pedras
suando-se muito em cima,
a de tentar despertar
terra sempre mais extinta,

a de querer arrancar
alguns roçado da cinza.
Mas, para que me conheçam
melhor Vossas Senhorias
e melhor possam seguir
a história de minha vida,
passo a ser o Severino
que em vossa presença emigra.

(Morte e Vida Severina - Introdução)