Florbela Espanca

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Cantigas leva-as o vento...

A lembrança dos teus beijos
Inda na minh'alma existe,
Como um perfume perdido,
Nas folhas dum livro triste.

Perfume tão esquisito
E de tal suavidade,
Que mesmo desapar'cido
Revive numa saudade

Na vida nada tenho e nada sou;
Eu ando a mendigar pelas estradas...
No silêncio das noites estreladas
Caminho, sem saber para onde vou!

Tinha o manto do sol...quem mo roubou?!
Quem pisou minhas rosas desfolhadas?!
Quem foi que sobre as ondas revoltadas
A minha taça de ouro espedaçou?

Agora vou andando e mendigando,
Sem que um olhar dos mundos infinitos
Veja passar o verme, rastejando...

Ah! quem me dera ser como os chacais
Uivando os brados, rouquejando os gritos
Na solidão dos ermos matagais!...

"É só teu o meu livro; guarda-o bem;
Nele floresce o nosso casto amor
Nascido nesse dia em que o destino
Uniu o teu olhar à minha dor."

Há uma primavera em cada vida
é preciso cantá-la assim florida.
(Em "Charneca em flor: sonetos – Fonte: Templo Cultural Delfos)

Mentiras
Ai quem me dera uma feliz mentira
que fosse uma verdade para mim!
J. DANTAS

Tu julgas que eu não sei que tu me mentes
Quando o teu doce olhar pousa no meu?
Pois julgas que eu não sei o que tu sentes?
Qual a imagem que alberga o peito meu?

Ai, se o sei, meu amor! Em bem distingo
O bom sonho da feroz realidade...
Não palpita d´amor, um coração
Que anda vogando em ondas de saudade!

Embora mintas bem, não te acredito;
Perpassa nos teus olhos desleais
O gelo do teu peito de granito...

Mas finjo-me enganada, meu encanto,
Que um engano feliz vale bem mais
Que um desengano que nos custa tanto!

Florbela Espanca, in "A Mensageira das Violetas"

Infinita é a saudade que teima me torturar!

... A felicidade na vida é já uma coisa
tão restrita e quase convencional que tirar da
vida uma parcela mínima desse luzente tesouro, tão ambicionado e tão quimérico,
é a maior das loucuras humanas...

IMPOSSÍVEL

Disseram-me hoje, assim, ao ver-me triste:
"Parece Sexta-Feira de Paixão.
Sempre a cismar, cismar de olhos no chão,
Sempre a pensar na dor que não existe...

O que é que tem?! Tão nova e sempre triste!
Faça por estar contente! Pois então?!..."
Quando se sofre, o que se diz é vão...
Meu coração, tudo, calado, ouviste...

Os meus males ninguém mos adivinha...
A minha Dor não fala, anda sozinha...
Dissesse ela o que sente! Ai quem me dera!...

Os males de Anto toda a gente os sabe!
Os meus... ninguém... A minha Dor não cabe
Nos cem milhões de versos que eu fizera!...

In Livro de Mágoas, 1919

Inserida por karol_santos

Os livros - é o remédio que eu sempre receito e quase sempre dá um resultado razoável. Ponho em jogo o egoísmo humano, e lembro-me de que sempre há-de consolar a nossa dor o espectáculo da dor dos outros...

Sonho que sou alguém cá neste mundo...
Aquela de saber vasto e profundo.

Inserida por dia_marti

- E ser, depois de vir do coração,
O pó, o nada, o sonho dum momento

Inserida por dia_marti

Vivo sozinha em meu castelo: a Dor!
Chora o silêncio... nada... ninguém vem...

Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do sonho, e desta sorte
Sou a crucificada... a dolorida... (...)
Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber porquê...

Inserida por dia_marti

Se me ponho a cismar em outras eras
Em que ri e cantei, em que fui querida,
Parece-me que foi noutras esferas,
Parece-me que foi numa outra vida...
(...)
E as lágrimas que choro, branca e calma,
Ninguém as vê brotar dentro da alma!
Ninguém as vê cair dentro de mim!

Nesse triste convento aonde eu moro,
Noites e dias rezo e grito e choro
E ninguém ouve... ninguém vê... ninguém...

E ser-se novo é ter-se o paraíso,
É ter-se a estrada larga, ao sol, florida
Aonde tudo é luz e graça e riso!
Dizem baixinho a rir : "Que linda a vida!..."
Responde a minha Dor : "Que linda a cova!"

Gritem ao mundo inteiro esta amargura,
Digam isto que sinto que eu não posso!...

Inserida por dia_marti

Sou, como tu, um riso desgraçado!
Não ser poeta assim como tu és
Para gritar num verso a minha Dor!...

Inserida por dia_marti

Gritando que me acudam, em voz rouca
Eu, náufraga da vida, ando a morrer

Sonhos que logo são realidades,
Que nos deixam a alma como morta!

Inserida por dia_marti

Os teus olhos são frios como espadas
E claros como trágicos punhais
Têm brilhos cortantes de metais
Vejo neles imagens retratadas
De abandonos cruéis e desleais

Procurei o amor, que me mentiu
Pedi à vida mais do que ela dava..

Ódio por ele? Não...se o amei tanto,
Se tanto bem lhe quis no meu passado (...)
Nunca mais amá-lo é já bastante! (...)
Ódio por ele? Não... não vale a pena...

Fecha os teus olhos bem! Não vejas nada!
Empalidece mais! E, resignada,
Prende os teus braços a uma cruz maior!

Inserida por dia_marti

-Eu sou Aquela de quem tens saudade,
A princesa do conto : "Era uma vez..."